084. Perspectivas da Criação
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Existem diversas linhas interpretativas que os cristãos adotam para entender o Livro de Gênesis e os relatos da Criação, mesmo entre aqueles que consideram a Bíblia como a Palavra de Deus, infalível e autoritária. O debate não é sobre a veracidade do texto, mas sobre o seu significado.
A seguir estão listadas cerca de dez interpretações diferentes, que podem ser agrupadas em visões mais literais/concordistas (que buscam paralelos históricos e científicos) e visões não-concordistas (que priorizam a mensagem teológica):
1. Criacionismo da Terra Jovem (Young Earth Creationism)
Esta é a perspectiva de que a Terra foi criada em sete dias literais de 24 horas. Esta visão combina os sete dias literais da criação com as genealogias de Gênesis, vistas como uma cadeia ininterrupta de idades literais, resultando na criação do mundo há cerca de 6.000 a 10.000 anos.
• Esta visão incorpora geralmente a geologia do dilúvio (flood geology), atribuindo fenômenos como a formação do Grand Canyon e o catastrofismo geológico a um Dilúvio universal.
• Organizações como Answers in Genesis e Creation Ministries International promovem e defendem esta visão por meio de exegese bíblica e teorias científicas.
2. Visão da Aparência da Idade (Appearance of Age)
Esta perspectiva também defende os sete dias de 24 horas. No entanto, ela argumenta que o universo aparenta ser antigo porque Deus lhe deu uma aparência de idade no momento da criação.
• Um argumento comum para essa visão é que Adão e Eva, embora tivessem apenas um dia de idade, não poderiam ter se parecido com bebês recém-nascidos, mas sim com adultos (como se tivessem 25 ou 30 anos).
• Uma objeção a essa visão é que, se Deus incluiu eventos históricos passados (como evidências de supernovas que teriam ocorrido milhões de anos antes), isso implicaria que Deus “inseriu eventos enganosos” na história do universo, além de somente o fazer parecer mais velho.
3. Visão Dia-Era (Day-Age View)
Nesta visão, Gênesis ainda é um relato histórico do que aconteceu, mas a palavra hebraica para “dia” (yam) é interpretada como um período de tempo indeterminado ou metafórico, em vez de um período de 24 horas.
• Os dias criativos seguiram a ordem correta, mas a duração desses dias pode ser diferente—podendo ser 10 minutos ou 50 milhões de anos.
• Esta é tipicamente uma perspectiva criacionista da Terra Antiga (Old Earth creationist perspective).
• Embora desafiador, pode-se tentar conciliar esta visão com a evolução. Organizações como Reasons to Believe, promovida por Hugh Ross, historicamente apoiaram uma teoria do tipo Dia-Era, vendo a criação como progressiva ao longo do tempo.
4. Visão do Dia Intermitente (Intermittent Day View)
Esta visão concorda que cada dia de criação foi um período literal de 24 horas, mas postula que houve espaços indeterminados de tempo (que poderiam ser milhões de anos) entre os dias.
5. Teoria da Lacuna (Gap Theory)
A Teoria da Hiato (ou Ruin-Restoration) sugere que existe uma lacuna massiva de tempo entre Gênesis 1:1 (“No princípio, Deus criou os céus e a terra”) e Gênesis 1:2 (“E a terra estava sem forma e vazia”).
• Os proponentes sugerem que a Terra originalmente criada se tornou “sem forma e vazia” (implica que tornou-se assim, em vez de ter sido criada assim) após algum evento, talvez a queda de Satanás, que dizimou a Terra.
• Neste caso, Gênesis 1 (após o versículo 1) seria um relato da reforma (reforming account) da Terra, e não da criação inicial.
Visões Não-Concordistas e Alternativas
As interpretações não-concordistas não tentam encontrar paralelos científicos ou um relato histórico literal, mas sim focam na mensagem teológica de Gênesis.
6. Visão do Espaço Sagrado/Função Atribuída (Sacred Space/Assigning Function View)
Esta visão, promovida por John Walton, sugere que quando Deus “cria” o sol, a lua ou as estrelas, Ele não está necessariamente realizando a criação material (ex nihilo), mas sim atribuindo-lhes função e dando-lhes um nome.
• A atividade de Deus em Gênesis é vista como a criação teológica de um espaço de Templo ou Espaço Sagrado onde Ele pode habitar com o homem.
• Adão e Eva são vistos em papéis semelhantes a sacerdotes/sacerdotisas.
7. Adão Genealógico (Genealogical Adam/Special Creation)
Esta visão permite a coexistência de hominídeos evoluídos e a história de Adão e Eva.
• Adão e Eva são vistos como uma criação especial—seja uma criação de novo a partir do nada, ou dois hominídeos selecionados de uma população existente e aos quais Deus deu Sua Imagem.
• Eles são os progenitores genealógicos de toda a humanidade que existia na época de Jesus, mas não são necessariamente os únicos humanoides/hominídeos que existiram.
• Caim encontraria sua esposa entre as outras criaturas ou “humanos” existentes. Esta teoria pode se ajustar à evolução. Joshua Swamidoss está associado a esta ideia.
8. Visão do Dia Analógico (Analogical Day View)
Nesta interpretação, os termos “manhã e tarde” em Gênesis não se referem a dias de 24 horas, mas são uma analogia para trabalho e descanso.
• Gênesis 1 registra sessões de trabalho (work sessions) de Deus, que poderiam durar qualquer período de tempo (um momento, ou 100 milhões de anos), seguidas por descanso.
9. Hipótese da Estrutura (Framework Hypothesis)
Esta é uma leitura não-concordista que afirma que Gênesis foi concebido para transmitir apenas teologia e não é um relato histórico.
• Os proponentes sugerem que a Bíblia não está preocupada em corrigir a cosmologia errada das pessoas do Antigo Oriente Próximo, mas sim em ensinar-lhes verdades teológicas. Esta ideia é chamada de acomodação.
• As mensagens teológicas principais que eles extraem incluem o monoteísmo, a separação entre a matéria e a divindade, a origem única de toda a humanidade (igualdade humana), o estabelecimento da Queda e o caminho final para Jesus Cristo.
• Michael Heiser é associado a este tipo de pensamento.
10. Visão da Mito História (Mytho History View)
Esta visão, promovida recentemente por William Lane Craig, é considerada uma combinação de “mito” (no sentido de uma história antiga destinada a fornecer mensagens teológicas) e “história”.
• Embora use o termo “mito” (o que pode ser mal interpretado como “não verdadeiro” pelo público em geral), os defensores creem que Adão e Eva eram pessoas reais e que Deus criou realmente o mundo ex nihilo (do nada).
• Gênesis 1-11 é visto como um relato verdadeiro que utiliza o gênero de mito história e emprega arquétipos (como Adão e Eva) para comunicar verdades maiores.
• Esta interpretação não exige uma correspondência perfeita nos dias de 24 horas.
• O desafio desta visão é determinar quais partes de Gênesis são historicamente literais e quais são mais arquétipos. Pode ser compatível com a criação da Terra Antiga e com a evolução, mas não depende dela.
É importante notar que crentes genuínos e salvos se encaixam em todas essas categorias. Embora nem todas as visões possam estar igualmente corretas, a aceitação de uma delas não determina a salvação, e o foco principal de Gênesis é a mensagem teológica.